Até um dia, querida São

Estranhei não responderes às últimas mensagens, umas vezes mais frequentes, outras mais espaçadas, que sabes que assim sou, embora não me esquecesse. Dei tempo ao tempo porque quem padece nem sempre tem disposição para conversas, mas, de facto,  estranhei. Quando hoje recebi a primeira mensagem com a notícia, obtive a resposta ao teu silêncio que se perpetua agora.

Foste resiliente, São. Sabe-se lá porquê. Conseguias guardar para ti aquilo que sabias não acrescer nada, nem a ninguém. Coragem não te faltou e não foram poucas as vezes que surpreendeste. Deste sempre mais do que algumas vezes recebeste, foste determinada e genuína. Mulher de muitos ofícios e de gosto por bem fazer.


Tinha em mente ir visitar-te, mas podia não ser oportuno para ti, pensava eu. Temos de ir. Só que não fomos. Os adiamentos às vezes dão nisto. Talvez tenhas sentido a falta da presença dos muitos que te rodearam durante anos. Desculpa-me se não soube ler nas entrelinhas. Sabes, para quem está de fora há um misto de dificuldade em lidar e em entender. Achamo-nos a mais nas perguntas e, por vezes, na presença.


Talvez porque não goste [da vulgaridade] do termo heroína, não o vou usar para te definir. Foste, antes, valente e se não continuaste a luta foi porque sentiste, do alto da tua racionalidade, que o teu momento estava a chegar. Espero que assim tenha sido.

Queria ter-te dito estas palavras, ou que as lesses, mas por achar que soariam a despedida, e não a homenagem, não o fiz. Podias ter ficado mais um pouco para, hipoteticamente, termos fumado um cigarro ou bebido mais um copo, como em tempos fizemos, e dar um pezinho de dança ou organizar umas festarolas. Se tu gostavas…


Ficam-me os sonhos de Natal, que orgulhosamente exibias, brilhantes e redondinhos, decorados com bagos de romã, o presépio pintado pelas tuas mãos e outras decorações. Ficas na memória de muitos, São, pela simpatia, pelo teu sorriso, pela tua elegância e distinção no trato e pela calma com que lidavas com a adversidade. Sabe Deus como estarias agora, ou só tu sabes.


Até um dia, querida São.




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