Hora de despedida





Mudar custa.
Mudar dá-nos arrepios.
Mudar deixa-nos com a cabeça a mil.
Mudar deixa-nos sem chão.
Mudar revolta-nos as entranhas.
Mudar traz-nos noites sem dormir.
Mudar dá-nos dias de desnorte.
Mudar faz chorar.

Então, porquê mudar?

Muda-se pela insatisfação do presente;
Muda-se pela vontade de conhecer novas realidades e pessoas;
Muda-se por se querer uma vida diferente.
Muda-se pela vontade de aprender.
Muda-se pela vontade de fazer diferente, porque se é capaz.


Ninguém sai da zona de conforto, e muito menos aos 40+ só por cá cá aquela palha. Nesta faixa etária podes não saber ainda o que te fará feliz, mas tens a certeza do que não te faz. Para além disto,  ninguém de forma deliberada, deixa o certo para o duvidoso; se o faz ou é por vontade expressa ou imposição.

Foram quase 15 anos a dar de mim, o melhor que sabia e que podia. A ensinar e a aprender (muito). A tornar-me uma pessoa melhor e mais tolerante.
Fiz de alguns alunos, amigos para a vida. Hoje são homens e mulheres; uns já com filhos e uma profissão para a qual também contribui. Outros conheci-os em forma de pedra por lapidar; por conseguinte, partiram já com luz própria como se de pedras preciosas se tratassem, o que prova que o caminho por vezes é árduo, mas a vitória saborosa.

Testemunhei dores de alma e apertos no peito que serviam de esconderijo a mágoas profundas e comportamentos estranhos; sustive lágrimas, outras cairam-me sem querer; ri de mim, deles, com eles (muito) e sem pretensões de lhes ser superior. Ensinei-lhes que o mundo vai muito para além da estrada que avistam.
Apresentei-lhes Eça, Carlos e Afonso (da Maia) como se fossem gente da minha lidação, e assim os arrastei para a mais extraordinária história da literatura portuguesa, a qual abominavam antes de conhecer. Por fim, apenas não gostavam do desfecho.
Mostrei-lhes Sintra dos meus encantos e acabei por conquistá-los, envoltos pelo romantismo da época. Mafra e o seu esplendoroso convento erguido pelo capricho de um rei, que levou por arrasto um povo à miséria. As loucuras de Pessoa... A grandeza de Camões...
E no final de cada obra provava-lhes a razão pela qual lhes dizia sempre: "A literatura não se estuda por acaso. Conhecê-la é também uma forma de nos conhecermos, a nós e à nossa sociedade".
A uns terá servido, outros lembrar-se-ão um dia; a outros passou-lhes ao lado. É assim.

Mostrei-lhes que a França é um país maravilhoso e que um dia certamente, terão oportunidade de conhecer e de comprovar o quão certa estava.
Arregaçámos as mangas e fizemos crepes e tartes e magustos; construimos bandeiras e mensagens; concursos de ortografia, árvores e decorações de natal, arraiais, e até uma "viagem" à idade média para que experienciassem que a vida já foi de outra maneira.
Juntos partilhámos momentos inesquecíveis, balizados entre o cinco estrelas e o escuro como bréu.

Tirei tempo da minha vida a pensar noutras tão enleadas e tão duras, para quem ainda tinha tão pouca idade. Dei boas e más notícias: liguei a pais e mães a dar conta de pequenas conquistas e resultados brilhantes; falei com outros, que destroçados me pediam ajuda, quando não sabiam já o que fazer.

Partilhei com colegas-amigos, confissões, alegrias e tristezas; almoços e lanches. Horas de conversas francas e desprendidas sobre a vontade de mudar o mundo. Gargalhadas, cigarros, cafés e receios.
Reflexões sobre este e aquele, numa tentativa de lhes traçar um futuro mais risonho.
Hoje ficam as lembranças.

As saudades, essas serão ultrapassadas pela presença dos que continuarão ao meu lado, mesmo sem partilharmos o mesmo espaço.
A mudança vive connosco, nos mais ínfimos pormenores: mudamos de gostos, de casa, de cidade, às vezes de amizades, de vida... A tudo nos adaptamos, em maior ou menor tempo.
Agora também já sei que a mudança é para os fortes, para os que não permitem amarras a toldar-lhes a liberdade. Por muito que isso nos possa custar.

Neste momento, é ajustar as velas e ao sabor do vento, dar novos mundos ao - meu - mundo.
Que a fé, a coragem e o amor nunca me faltem.

Para uns será até um dia; para outros, sempre!



“Cada um que passa na nossa vida, passa sozinho, pois cada pessoa é única e nenhuma substitui outra.
Há os que levam muito, mas há os que não levam nada. Essa é a maior responsabilidade da nossa vida, e a prova de que duas almas não se encontram ao acaso.”
                                                                                                          
                                                                                           O Principezinho, Antoine de Saint- Exupéry


Comentários

  1. Virar páginas é essencial para viver a plenitude. Pelo menos a nossa. ☺️ Que seja bom!! 😊

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