Professora Estela


Sem querer, os nossos caminhos cruzaram-se. Foi há nove anos e o Vasco foi o elo de ligação.
Juntas tornámos possível aquilo que se esperava não ser. De uma, filho, de outra, aluno; juntas conseguimos que começasse a ler.  Em paralelo fizemos com que se derrubasse uma barreira que se julgava intransponível e a que se chama dislexia. Uma em casa, outra na escola, a remar no mesmo sentido, trabalhando em sintonia e respeitando o tempo e as metas dele, o mais importante.

Ao longo destes anos, foram horas de conversas, de desabafos e de inquietações sobre um processo que se vislumbrava lento mas que começara a dar frutos, ainda no 1º ano de escolaridade. No final, o meu rapaz já reconhecia os ditongos e alguns casos especiais de leitura, alcançando assim uma razoável fluência leitora, embora um pouco abaixo da prevista para aquele ano inicial.
Continuámos em jeito de comparsas, com os mesmos truques de magia, na tentativa de tirar da cartola o melhor coelho. Foram assim os primeiros quatro anos. Mas foram também, tomadas de decisão difíceis, vontade de desistir, escolhas erradas e mudanças de sentido da minha parte. Em resposta, calma e ponderação. Houve de tudo, todavia, apesar das pedras no caminho, os resultados iam provando que nós somos efetivamente, aquilo que quisermos ser. Assim façamos por isso.

Passaram nove anos. Hoje leu-se o relatório final, que em nada fugiu ao fiel retrato daquele que lhe dá corpo. Após tanto para contar porque se viveu,  deixamo-lo voar. Agora sim, está nas mãos dele, o seu futuro. Cresceu e a maturidade também o presenteou. Em si, um dom que muitos querem mas não têm. Por isso, o mérito é dele, mas a vigília foi nossa. Só nós sabemos o que foi e como foi. Só nós sabemos a angústia que me ia na alma e que algumas vezes me saiu pelos olhos.
Tudo passou, como assim é com tudo na vida. O muito de um momento deixa de o ser com o tempo, com a experiência, com a vontade. Não deixou de ser disléxico; antes assume com naturalidade um constrangimento, que com esforço e dedicação foi minorado.

Seja o que for, nós aguentamos, até porque as adversidades tornam-nos mais fortes.
Por outro lado, há os que sempre acreditam e levam a sério o trabalho que têm em mãos, por isso o agradecimento ficará para sempre, pois o esquecimento não mora aqui.
Ainda bem que tivemos a sorte de cruzar o mesmo trilho, professora Estela.

Empatia é assim de repente, a palavra que me vem à ideia.



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